|   | 
                        Resumo: O presente artigo tem como o objetivo  apresentar um caso clínico atendido durante  
                          o estágio de Psicologia no Serviço de Psiquiatria do Hospital das  Clínicas-UFMG em Belo Horizonte, buscando salientar a noção de “construção do  caso clínico” e o estabelecimento de redes em Saúde Mental. Além disso, este  trabalho busca ressaltar a importância do saber construído pelo próprio  paciente, o que pode revelar aspectos particulares e únicos de cada caso,  norteando a elaboração de intervenções mais eficazes.  
                           
                          Palavras-chave: Construção  de redes; caso clínico; saúde mental.  
   
  Abstract: This article has as objective to present a  clinical case treated during the stage of Psychology in Psychiatry Service,  Hospital das Clinicas-UFMG in Belo Horizonte, seeking to emphasize the notion  of "construction of clinical case" and networking on Mental Health.  Furthermore, this work highlights the importance of knowledge built by the  patient, which can reveal unique and special aspects of each case, guiding the  development of more effective interventions. 
   
Keywords: Construction of  networks; clinical case; mental health.  
                            
                              
                                  
                                1. A Clínica na Saúde Mental: O Caso  Clínico e a Construção de Redes.   
                                  Não são incomuns, na  clínica em Saúde Mental, casos que nos confrontam com os dispositivos  tradicionais de tratamento pautados no discurso médico, que se colocam no lugar  de saber sobre o paciente e que pouco consideram o que este tem a dizer acerca  do seu adoecimento e de sua história. Já nos dizia Viganó que tal postura  revela uma: “construção baseada num saber outro que não o do paciente, e que  aponta para o manejo institucional.” (VIGANÓ, 1999 apud ANDRADE, 2005).  
                                  Por outro lado, a noção de Caso  Clínico proposta pelo mesmo autor evidencia o saber que o próprio paciente  traz acerca de si mesmo, revelando, dessa forma, a maneira como se relaciona  com o Outro e como se dá a organização de suas formas de gozo. Tudo isso, rompe  com ações clínicas de alguns serviços de Saúde Mental que se repetem a revelia  das particularidades do sujeito, pois há, dessa forma, uma preocupação em  escutar o paciente antes mesmo da classificação deste em algum quadro da  nosologia psiquiátrica (ALKIMIN, 2003).  
                                   
                                  Antes de entrar no caso  clínico que será discutido, é necessário realizar um breve resgate das origens  dessa concepção que prioriza o saber construído pelo próprio paciente, pois ela  ilustra modificações epistemológicas introduzidas na pós-modernidade em  oposição às idéias emergentes no sec. XVI, introduzidas nas ciências sociais  por volta do séc. XVIII.  
                                  Com o advento da Revolução Científica do sec. XVI houve uma  ruptura com as noções predominantes na Idade Clássica, na Idade Média e no  Renascimento que eram fiéis à concepção de que:  
                                  {... o empreendimento da  vida cotidiana, em meio ao qual vivemos e existimos, não é matemático. Nem  mesmo matematizável. Ele é o domínio do movediço, do “mais-ou-menos, do  “quase”. (...) Na natureza não existem círculos, elipses ou linhas retas. É  ridículo querer medir com exatidão as dimensões de um ser natural (...) existe  sempre a margem da imprecisão.} (KOYRÉ, 1991, p.272).  
                                  Assim, a concepção do  “mais-ou-menos” baseava-se na idéia de que não há verdade absoluta e impassível  de questionamentos, visto que a realidade é composta por uma série de variáveis  que podem fugir do controle do cientista. Além disso, é necessário ressaltar  que esse modo de compreender o mundo valorizava a experiência, ou seja, o  “conhecimento espontâneo ou vivido que indivíduo adquiriu ao longo da vida.”  (JAPIASSU, 1991, p.96).  
                                   
                                  Por outro lado, o saber  construído pela Revolução Científica fundamentava-se na descoberta de leis  universais e absolutas através de experimentos rigorosamente controlados, com o  auxílio instrumental e teórico. Esse modelo totalitário, além de desconsiderar  os meios de conhecimento que não se ajustavam aos seus princípios e métodos,  buscava:  
  “...  provocar, a partir de certas condições bem determinadas, uma observação tal que  o seu resultado, que não pode ser assinalado de antemão, seja capaz de fazer  conhecer a natureza ou a lei do fenômeno estudado.” (LALANDE, 1999, p.367).  
                                   
                                  De  acordo com SOUSA SANTOS (1988), através de quantificações obtidas através  experimentação dentro de parâmetros rígidos e pré-estabelecidos seriam, então, criadas  classes e divisões do objeto estudado com o intuito de eliminar tudo o que  seria irrelevante, reduzindo, dessa forma, sua complexidade. Tudo isso com o  objetivo final de sobrepujar e modificar a realidade.  
                                  No que concerne à  psiquiatria, pode-se dizer que, em seus primórdios, esta ficava às margens do  saber científico (experimental), por lidar com fenômenos pouco exatos e pela  dificuldade de mensurá-los. Foi através do discurso médico-experimentação  controlada-que essa especialidade alcançou o estatuto de ciência, lançando mão  tanto da criação de sistemas classificatórios como de experimentos controlados.  Assim, fica a seguinte questão: como, de fato, se dá a influência do discurso  médico-científico sobre o discurso psiquiátrico?  
                                   
                                  A partir da história da  psiquiatria e da própria medicina é possível perceber que o avanço dessa área  do conhecimento é permeado pela evolução de seus sistemas classificatórios que  são essenciais para delimitar as bases conceituais de uma teoria e o foco  através do qual determinado objeto de estudo será analisado. Na atualidade  estamos vivendo um abandono da clínica, a formação do psiquiatra é  eminentemente técnica, o que leva à tentativa de aniquilar a subjetividade e a  nosografia psiquiátrica, através da relevância dada aos aspectos sindrômicos e  universais das patologias, embasados pelo discurso científico. Tudo isso,  devido ao progresso na compreensão e no tratamento (principalmente  farmacológico) dos transtornos mentais.  
                                  Com o desenvolvimento da  farmacologia, de inegável importância para o tratamento das patologias mentais,  os profissionais de saúde mental se viram em vias de criar uma linguagem que  unificasse a comunicação das doenças mentais, com intuito de facilitar as  pesquisas de tratamentos específicos para cada transtorno. Dessa forma, foram  elaborados alguns sistemas classificatórios, desenvolvidos com extremo rigor  empírico e estatístico, os mais utilizados são a CID X (Classificação  Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados à Saúde-Décima Edição)  e o DSM-IV (Manual Diagnóstico e Estatístico de Doenças Mentais -Quarta  Edição). Aquela criada pela OMS (Organização Mundial de Saúde) e utilizada  principalmente na Europa e este criado nos EUA, o que não limita seu respaldo  internacional, visto que influencia diversos manuais de psiquiatria em  destaque, como Kaplan & Sadock (Compêndio de psiquiatria: ciência do  comportamento e psiquiatria clínica, 2007).  
                                   
                                  Tais sistemas foram criados com o fim de facilitar o  processo diagnóstico na psiquiatria, o que, por conseqüência, poderia levar a  escolha de um tratamento mais eficiente, além objetivar a comunicação entre os  diversos profissionais da área de saúde, ampliando o campo das pesquisas  clínicas e farmacológicas. Por último, há benefícios na busca etiológica dos  transtornos mentais. Para tanto, o DSM-IV segue alguns critérios que devem ser  observados como o próprio manual sugere: “os critérios diagnósticos específicos  incluídos no DSM-IV visam a servir como diretrizes que serão moduladas pelo  julgamento clínico não devendo ser usados como um “livro de culinária”.  (DSM-IV, pg 29). Entre eles estão a primazia pela abordagem descritiva que se  preocupa de fato com aqueles aspectos clínicos que ilustram o modo de  manifestação de determinado transtorno mental, a particularidade das diretrizes  diagnósticas que indicam uma lista a ser preenchida pelo indivíduo para que ele  se enquadre em determinada categoria, a descrição sistemática que aborda os  mesmos aspectos em todos os quadros nosológicos (idade, cultura e gênero,  prevalência, incidência e risco, curso, complicações, fatores de predisposição,  padrão familiar, diagnóstico diferencial.) e a possibilidade de lidar com  incertezas diagnósticas, já que o manual indica caminhos específicos para  classificar situações em que as informações sobre o paciente são insuficientes  para enquadrá-lo em alguma classificação.  
                                   
                                  É necessário evidenciar que até o DSM-III  e a CID-9 a topografia psiquiátrica foi fortemente influenciada pela nosologia  e pela nosografia de Freud que, por sua vez, elaborou seu sistema  classificatório com base na psiquiatria clássica: de Krafft-Ebing herdou a  perversão; de Kraepelin, a paranóia; retirou a idéia de neurose de Charcot e  recusou a inovação de Bleuler ao criar o termo esquizofrenia. (BERCHERIE, 1989).  
                                  Cabe destacar também que partindo da  definição de que os transtornos mentais são  
                                
                                  
                                    “(...) síndromes ou padrões comportamentais ou psicológicos  clinicamente importantes, que ocorrem no indivíduo e estão associados a  sofrimento (p.ex.,sintoma doloroso) ou a incapacitação (p.ex. prejuízo em uma  ou mais áreas importantes do funcionamento) ou a um risco significativamente  aumentado de sofrimento, morte, dor, deficiência ou perda importante da  liberdade. Além disso, essa síndrome ou padrão não deve constituir meramente  uma resposta previsível e culturalmente aceita diante de determinado evento,  por exemplo a morte de um ente querido. Qualquer que seja a causa original, a  síndrome deve ser considerada no momento como manifestação de uma disfunção  comportamental,psicológica ou biológica....” (KAPLAN & SADOCK, 2007, p.  325) 
                                   
                                 
                                 o DSM-IV constrói uma classificação eminentemente  sindrômica e ateorética, já que considera exclusivamente os sintomas,  independente de sua explicação etiológica. O diagnóstico sindrômico deveria  apontar para algo mais profundo, ou seja, para aquilo que seria a doença de  fundo, para o diagnóstico nosológico. No entanto, atualmente observa-se que  este está cada vez mais voltado para as reações e comportamentos observáveis,  deixando de lado seu caráter fenomenológico que envolve uma descrição metódica  das patologias com intuito de elaborar uma intervenção mais consciente e que  tenha efeitos menos imediatistas. A busca por uma psiquiatria baseada em  evidências, que considera somente achados empíricos conseguidos mediante  respostas positivas ou negativas à determinada medicação, destrói a  possibilidade de emergência da sabedoria do sujeito acerca do seu próprio  sintoma, isto é, o discurso científico como única fonte de saber inverte a  finalidade do tratamento medicamentoso que passa a servir não só como  apaziguador de sintomas patológicos, como também para a criação de novas  doenças. Novas classificações são concebidas a partir da evolução de terapias  químicas e farmacológicas, financiadas pela própria indústria farmacêutica.  (QUINET, 2001)  
                                 
                                
                                  
                                     
                                      O diagnóstico na medicina como um todo  pode ser definido como:  
                                      “(...) processo  cujo objetivo é o discernimento, o reconhecimento de determinada doença. Ele  supõe uma preliminar: a existência de doenças nitidamente definidas. Em  medicina, o processo epistemológico segue sempre a mesma progressão histórica:  num primeiro estágio, a entidade mórbida emerge sob forma de um quadro  descritivo, resultante da observação clínica. Num segundo estágio um substrato  anatômico lhe é reconhecido. A descoberta do agente etiológico das lesões  constitui o terceiro estágio. A entidade nosográfica está perfeitamente  definida, quando munida dessas três dimensões. Apesar das diferenças essenciais  que discernimos entre a sintomatologia psiquiátrica e a sintomatologia  orgânica, nossos predecessores do último século não podiam deixar de seguir o  mesmo procedimento, aplicado à doença mental.” (KAMMERER e WARTEL, 1989, p.  28).  
                                     
                                   
                               
                                 
                                  Portanto, nota-se que, cada  vez mais, a psiquiatria se aproxima da ciência médica e experimental, colocando  em segundo plano tudo o que não se encaixa nesses parâmetros, inclusive  informações trazidas pelo próprio sujeito. Logo, quem coordena e controla o  tratamento é exclusivamente o psiquiatra.  
                                  Precisamente nesse ponto,  entra a resistência psicanalítica que aponta aspectos de extrema relevância os  quais vão além da descrição de fenômenos universais, pois incluem aquilo sobre  o sujeito que extrapola as aparências por estar velado, só podendo ser acessado  através da linguagem e de aspectos singulares do sujeito. Ao contrário das  correntes psiquiátricas que primam pelo funcionalismo (disfunção), sem se  importar com o aspecto da história de determinada enfermidade, a psicanálise  considera que o indivíduo é capaz de se implicar nos seus próprios sintomas, o  que possibilita ao analista encontrar-se com aquilo que há de novo em cada  caso. Contudo, a psicanálise não se esquece da importância do diagnóstico e da  influência da psiquiatria na construção de sua clínica, pode-se dizer que  aquela tenta unir peculiaridades que podem ser encontradas em cada paciente à  linguagem universal utilizada pelos profissionais que trabalham na área da  Saúde Mental, o que difere é o uso que é feito dessa linguagem, pois a  psicanálise tenta não se limitar ao mundo fenomenológico. Como bem disse  Miller: “Claro que há sintomas típicos, porém mesmo que tenham a mesma forma,  cada um deles é peculiar e particular porque, como assinala Lacan, o sentido do  mesmo sintoma em diversos sujeitos é diferente.” (MILLER, J.A, 2006, p.30).  
                                   
                                  Há  ainda, em oposição às internações hospitalares e ao tipo de procedimentos  clínicos da psiquiatria tradicional utilizados com os pacientes, o Movimento  Antimanicomial, também muito influenciado pela psicanálise, com o qual  começaram a ocorrer mudanças, tanto na forma de compreender a doença mental  como em seu tratamento. Com a saída dos pacientes dos manicômios e com a  criação de serviços substitutivos (CERSAM’s, CAP’s e Ambulatórios), as  variáveis que deveriam ser analisadas para a elaboração da terapêutica a ser  seguida pelo paciente se multiplicaram. Assim, a psiquiatria perdeu o tal  almejado domínio completo sobre seu objeto, tendo que lidar com situações  inovadoras e impassíveis de controle.  
                                  O caso clínico descrito a  seguir, acompanhado durante o estágio do Serviço de Psiquiatria do Ambulatório  Bias Forte-Hospital de Clínicas-MG, busca esboçar justamente o tratamento de  uma paciente nos moldes da Reforma Psiquiátrica, inclusive em um serviço  onde não há internação. Considera ainda a influência da psicanálise no que  concerne à reinvenção da clínica, na escuta do sujeito e na pluralização dos  saberes, propiciando a construção de redes e o trabalho interdisciplinar.  
                                   
                                  Trata-se de A., uma  paciente de 45 anos, que veio encaminhada para o Serviço de Psiquiatria do  Hospital das Clínicas pelo Psicólogo com quem fazia tratamento há um mês. No  encaminhamento dessa paciente havia duas hipóteses diagnósticas, segundo os  critérios do CID-X: F32. 2-Episódio depressivo grave sem sintomas psicóticos e  F33.2-Transtorno depressivo recorrente, episódio atual grave sem sintomas  psicóticos. Contudo, essas classificações pouco diziam da paciente e sobre o  motivo de sua procura pelo serviço.  
                                  O primeiro contato com A.  foi bastante difícil, ela chegou ao Ambulatório extremamente nervosa e  agressiva, a procura do profissional que iria atendê-la e dizendo que os  funcionários a estavam destratando, faltando-lhe com respeito. Contudo, ao  entrar no consultório a paciente desabou em lágrimas e começou a contar sua  história, bastante sofrida e repleta de miséria.  
                                   
                                  Iniciou o relato pela  história de seus quatro filhos. Contou que seu ex-marido os abandonou enquanto  os filhos eram ainda bebês, nessa época, passou por sérias dificuldades  financeiras. Em prantos, narrou a morte de um de seus filhos, devido á má  nutrição. Ela disse: “Meu filho morreu de fome”(sic). Trata-se de um casal de  gêmeos, contudo a menina, apesar de ter ficado em coma por um tempo, conseguiu  sobreviver. Esta teve algumas seqüelas e, atualmente, está tendo problemas de  aprendizagem. Após esse episódio, a paciente fez um juramento de que nunca mais  perderia nenhum outro filho. Desde então, tornou-se uma mãe super-protetora,  dedicando sua vida exclusivamente aos filhos. No entanto, a tragédia não  termina aí, a filha sobrevivente foi vítima de abuso sexual, aos 10 anos, por  um vizinho. Como sua mãe trabalhava o dia todo, ela e os irmãos ficavam em casa  sozinhos. A. contou que se sente culpada até hoje, pois mesmo com sua promessa,  não conseguiu manter os filhos seguros.  
                                   
                                  Ainda  em relação à sua família, A. relatou que seu pai é um homem violento, com o  qual não tem mais contato desde que a mãe faleceu, que abusava e maltratava a  esposa: “Minha mãe tinha uma marca na perna que foi feita pelo leite quente que  meu pai jogou nela. Ela teve três derrames, até ficar na cadeira de rodas e  falecer, quatro anos atrás.” (sic). Além disso, disse que o pai tinha duas  famílias que moravam em casas uma de frente para a outra, no mesmo terreno.  Ambas as esposas sabiam do fato, contudo continuavam casadas com esse homem. A.  comenta que ela e os irmãos achavam aquela situação estranha, mas ninguém  falava nada com medo do pai. Sobre os homens de sua vida ela resume seu  sentimento: “Odeio homem. Mataria três, meu ex marido, meu vizinho e meu pai.”  (sic)  
                                   
                                  No momento da primeira  entrevista, A. havia perdido seu emprego de faxineira há 8 meses.Tal situação a  angustiava extremamente, pois além de precisar cuidar de seus filhos, a  paciente encontra no trabalho um meio de sentir-se estimada. Assim, para essa  paciente, o trabalho é uma questão central.  
                                  De acordo com o relato da paciente, ela já havia passado por  alguns tratamentos psiquiátricos anteriormente, chegando a fazer uso de  antidepressivos e ansiolíticos que, segundo ela, tiveram pouco efeito sobre seu  quadro, já que atuaram somente no sentido de deixá-la mais calma. De acordo com  TEIXEIRA (2007):  
                                   
                                 
                                
                                  
                                    “O efeito de uma terapêutica depende de  uma conjunção complexa de fatores que de longe ultrapassam as transformações  físico-químicas que um medicamento produz no corpo de um paciente: elas  percorrem um leque que se estende desde o sentido que tem, para determinado  sujeito, estar fazendo uso de uma substância, passando pelo modo de relação  transferencial que ele mantém com quem o prescreve, sem mencionar o tipo  variável de expectativa que ele dirige aos demais participantes da equipe que  dele se ocupa.” (TEIXEIRA, 2007, p.6)  
                                     
                                   
                                 
                                                                  Baseado nas particularidades de uma intervenção terapêutica e nas  informações trazidas por A., decidimos adotar uma postura um pouco diferente,  pois, ao invés da prescrição, talvez um pouco antecipada, de antidepressivos,  optamos por escutar a demanda da paciente e por encaminhá-la para o Serviço de  Assistência Social. Assim sendo, a instituição se coloca como parceira do  sujeito:  
                                  “A  instituição dá estrutura fixa à parceria do sujeito, à parceria criativa do  sujeito. Isto é porque devemos pensar que o encaminhamento, a finalidade do  tratamento é aquele que faz nascer um sujeito, um sujeito inédito.” (VIGANÓ,  2007)  
                                   
                                  A criação de uma rede, que  se iniciou com o movimento do psicólogo da paciente, foi fundamental para seu  tratamento, visto que, com o auxílio da Assistência Social, A. conseguiu um  emprego numa casa de família na região Metropolitana de Belo Horizonte. Desde  então, a paciente comenta que começou a sentir-se humana e apreciada: “Almoço e  janto com eles na mesma mesa, chego até a ficar incomodada, meus outros patrões  eram muito rígidos. Até de churrasco eu participo com eles. Somos todos iguais.  Me sinto mais humana e valorizada” (sic).  
                                   
                                  Atualmente, voltou para BH  onde está trabalhando numa casa de família. Começou também a fazer um curso de  gastronomia, disponibilizado para os beneficiados pelo Programa Bolsa Família,  no qual se formou há semanas atrás. A. disse que vai fazer outros cursos e  terminar o Ensino Médio, pois através dos estudos e do trabalho sente-se  importante e com forças para lutar por uma vida melhor: “Agora, estão chovendo ofertas  de emprego, estou muito feliz.” (sic). A valorização que a paciente encontrou  através do trabalho, repercutiu em vários outros aspectos de sua vida,  inclusive em seus relacionamentos sociais, pois voltou a se interessar pela  vida afetiva e sexual e a sair com amigos para dançar e se divertir, o que,  segundo ela, fazia muita falta: “Eu sou muito nova e bonita. Tenho muito pra  viver ainda, quero me divertir, estudar e ser alguém na vida.” (sic). Além  disso, foi possível notar mudanças visíveis até mesmo na aparência da paciente  que começou a se cuidar, andando muito bem arrumada, com as unhas decoradas e o  cabelo penteado.  
                                   
                                  Logo, percebe-se que ao nos voltarmos para o que a paciente  tinha a dizer, foi possível “criar o lugar do Outro que permite a palavra do  paciente.” (VIGANÓ ,1999. apud TEIXEIRA,2007). Só então, A. conseguiu encontrar  soluções menos dolorosas para seu sofrimento através de seu trabalho e dos  estudos: “Agora eu sei que tenho meu valor.” (sic). Finalmente, conclui-se que  
                                  “A tarefa do  psicanalista aí consiste (...) em oferecer ao sujeito uma possibilidade de  tematizar, de ressignificar e elaborar sua ‘miséria’, até onde for possível,  para tomar uma outra posição frente a toda essa desgraça cotidiana{...}.”  (FIGUEIREDO apud ABREU, 2001,p.111).  
                                 
                                REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:   
                                  ABREU, D.N.(2007). “A prática entre vários: A Psicanálise  na instituição de saúde mental.” Revista Eletrônica  
                                  CliniCaps n⁰2. Disponível em: http://clinicapsmen.com ALKIMIM, W.(2003). “Construir o  caso clínico, a Instituição enquanto exceção.” Almanaque de Psicanálise  e Saúde Mental. Belo Horizonte, Instituto de Psicanálise e Saúde Mental-MG,  n.9.  
                                   
                                  ANDRADE, R.(2005). “Discussão x  Construção do Caso Clínico”. Mental-Revista de Saúde Mental e  
                                  Subjetividade. UNIPAC, ano 3, n⁰4. BARRETO, F. “Como vejo a  psiquiatria hoje: entre aves e feras.”. Escola Brasileira de  Psicanálise. Disponívelem:http://www.ebp.org.br/biblioteca/pdf_biblioteca/Francisco_Paes_Barreto_Como_vejo_a_psiquiatr  ia_hoje.pdf. Data de  acesso: 20-05-2010.  
                                   
                                  BERCHERIE, P.(1989). Os fundamentos da  clinica: historia e estrutura do saber psiquiátrico. Rio de Janeiro:  
                                  J.Zahar. CHASSOT, A.  (1994). “E agora, quase século XXI”. in: A ciência através dos  tempos. 4 ed. São Paulo: Moderna.  
                                   
                                  JAPIASSU, H.; MARCONDES, D. (1991).  Dicionário básico de filosofia. 2.ed. rev. Rio de Janeiro. JASPERS, K.  (1979). Psicopatologia geral. 2.ª ed. (2 vols.). S. Paulo: Livraria  Atheneu. KOYRE, A. (1991). “Do mundo do “mais-ou-menos” ao universo da  precisão”. in: Estudos de historia do  
                                  pensamento filosófico. Rio de Janeiro: Forense Universitária.  LALANDE, Andre. (1999). Vocabulário técnico e critico da filosofia. 3.  ed. São Paulo: Martins Fontes. Manual  
                                  diagnóstico e estatístico de transtornos  mentais: DSM-IV-TR.(2002).  4. ed. texto rev. Porto Alegre: Artes Médicas. MIRANDA-SÁ JÚNIOR, Luiz Salvador  de; OLIVEIRA, Marcio Costa Leite de.(2009). O diagnostico  
                                  psiquiátrico. Rio de Janeiro: Cultura Medica.  
                                   
                                  PEREIRA, Mário. (1993) “Kraepelin e a  questão da manifestação clínica das doenças mentais”. Rev. Latinoam.  Psicopat. Fund., São Paulo, v. 12, n. 1, p. 161-166. QUINET, A.(2001) Psicanálise  e psiquiatria: controvérsias e convergências. Rio de Janeiro: Rios  Ambiciosos. SADOCK, B.; SADOCK, V.; KAPLAN, H.(2007). Compêndio de  psiquiatria: ciência do comportamento e  
                                  psiquiatria clínica. 9.ed. Porto Alegre: Artmed. SOUSA  SANTOS, B. (1987). Um discurso sobre as Ciências. Edições Afrontamento.  Porto, 1988. TEIXEIRA, A.M.R.(2007). “Tecendo a rede: A Psicanálise na Saúde  Mental” Revista Eletrônica CliniCaps n⁰ 1.  
                                  Disponível em: http://clinicapsmen.com   
                                   
                                  VIGANÓ, C.(1999). “A construção do caso  clínico em Saúde Mental”. Curinga-Psicanálise e Saúde Mental. Belo  Horizonte. EBP-MG, n.13, set. VIGANÓ, C.(2007). “Trabalho em equipe na  rede: A enfermeira e a instituição parceira” Revista Eletrônica  
                                  CliniCaps, v.1, n⁰3. Disponível em: http://clinicapsmen.com  
  
                                 
                               
                              | 
                          |